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Por Fabio da Silva Barbosa.
 Já fiz muita merda para arrumar uns trocados, sustentar a família e 
minhas ideias. Com certeza, umas das piores lembranças são de quando 
permiti a aproximação de políticos partidários, tentando conseguir apoio
 para projetos sociais e culturais que desenvolvia de forma 
independente. Era muito desgastante. Tentei várias siglas, mas todas se 
mostraram exatamente iguais quando a corda apertava o pescoço. Chegavam 
mansinhos, dizendo gostar da idéia e coisa e tal... Quando iam dar a 
grana, o apoio a cultura e ao social ia por água abaixo e começava a 
contrapartida. Foi uma das oportunidades que tive de confirmar que tudo 
funciona exatamente como eu penso. E ficava lembrando os mais velhos 
dizendo quando eu era adolescente: “Um dia você vai ver que não é bem 
assim que o mundo funciona”. Como queria que estivessem certos. Cheguei a
 recusar grana de um cara tendo a luz da minha casa cortada por falta de
 pagamento. E isso tudo não era porque desejava ser santo. Nunca tive 
vocação para santidade. Foi apenas minha escolha. Fiz o que tinha de 
fazer. Não quis participar desse mundo podre. Até hoje não me arrependi.
 
 Muito tempo depois de entender que não tinha temperamento 
para trabalhar com essas figuras, estava no supermercado e avistei o 
assessor de um desses caras. Entrei pelo corredor dos enlatados para não
 ter o desprazer do encontro. Passei no caixa, paguei as compras e saí 
do mercado. Pronto. Estava salvo. Ao respirar aliviado, senti a mão no 
meu ombro.
 - E aí? Viu a vitória que tivemos nas últimas eleições? Não quis caminhar com a gente...
 - Vitória? Ganhar as eleições quando se tem dinheiro para campanha não é o mais difícil. Eu quero ver agora.
 - Agora está tudo bem. Tá todo mundo tranqüilo.
 - Tranquilo? Como assim tranquilo? Os desabrigados das últimas chuvas 
continuam sem solução para seus problemas, quem produz cultura na cidade
 tá fudido, a especulação imobiliária continua ganhando dinheiro sem dar
 nada em troca pelo lugar que a enriquece, muito pelo contrário...
 Ele começou a olhar com cara de quem não entendia nada do que eu estava falando.
 - Se você estivesse com a gente, ia estar tranqüilo também.
 - É realmente lamentável que alguém na sua idade possa achar que está 
tudo bem em viver pendurado no saco de político. Sabendo que esses caras
 estão ganhando dinheiro às custas do sofrimento alheio. Se eu fosse 
você, teria vergonha de vir falar que está tudo tranqüilo.
 Virei a esquina e segui caminho. Ele ficou lá, olhando para os lados, sem saber para onde ir.
 
 Quando estava produzindo o Comunidade Editoria e o Impresso das 
Comunidades, era recebido com desconfiança nas primeiras visitas em 
certas comunidades. O pessoal já estava escaldado e perguntava logo se 
eu havia sido enviado por algum político ou instituição. Explicava que 
não era nada disso e que estava fazendo algo que simplesmente gostava, 
da maneira que achava certo. Aí que a desconfiança aumentava. Depois de 
muita pergunta e de ver que eu não tirava nenhuma vantagem política ou 
financeira com a iniciativa, vinha a pergunta:
 - Então, por que você faz isso?
 Realmente era difícil explicar que estava exercendo minha profissão de 
jornalista da forma que eu acreditava. As pessoas estão condicionadas a 
só fazerem algo que lhe proporcione vantagem material e não conseguem 
ter a mínima percepção que podemos ter muito mais que isso.
 OBS: 
Antes que alguém pense que eu estava nadando em dinheiro e que isso era 
apenas hobby, aviso que, nessa época, estava tão duro quanto hoje. Fazia
 esse trabalho com toda dedicação e compromisso. Descobri no trabalho 
alternativo/independente um sentido para a vida. Algo muito mais 
consistente do que a maioria adota como realidade e necessidade.
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Somos fragmentos literários,
ResponderExcluirFábio da Silva Barbosa,
meu amigo,
justamente porque a gente
não se vende
nas mais variadas
situações dessa vida.
Admiro você.
Em frente, sempre.